quarta-feira, 18 de novembro de 2009

Últimas palavras

Perdoe-me querida Lúcia por estas palavras encharcadas...

Estava eu deitada em minha alcova, a casa ainda dormia, quando bateram, rapidamente, a porta. Assustei-me pela hora. Bateram mais uma vez e neste momento me pareceram mais fortes, levantei-me num sobressalto imaginando que não desistiriam e temi por algo ruim...
Afastei vagarosamente a cortina, deixando apenas meus olhos, ainda baixos pelo sono, fitar os do meu insistente mensageiro.

- Perdoe-me senhorita pela hora! - exclamou o rapaz sem fitar-me, enquanto desembrulhava um envelope negro preso por uma fita minuciosamente armada em vermelho.
- Algo aconteceu? - interferi.
- Preciso lhe entregar isto e tamanha foi a urgência designada que não poderia deixar o amanhecer surgir...

Toquei o envelope e o tremor percorreu minha alma como outrora havia sentido. Lembra-se daquela tarde em que aquela dor, aquele sentimento que dilacerou meu peito? Senti o mesmo calafrio...

- De quem...?! - interroguei-o - não sei ao certo quanto tempo observei aquele negro envelope, nem se o que me chamara a atenção fora a escuridão ou aquela fita de sangue... Mas, fora o bastante para que o meu apressado mensageiro desaparecesse na escuridão...

Fechei a porta e enquanto procurava algum feixe ténue de luz dilacerei, delicadamente, o envelope. Parei imóvel próximo ao candelabro de bronze. Era uma carta... Ao ler as primeiras linhas atropeladas de tristeza e acusações ainda não me dei conta de meu misterioso remetente, entretanto, um apelido atribuído a mim revelava-me a autoria.

Ó Lúcia, amada Lúcia, aquelas palavras contidas ali não existiam em nenhuma língua falada sobre a terra, como ele pensara em tais vocábulos que para mim machucaram como um insulto? Tantos objetivos obscuros ele me atribuía...Procurei algo sólido em que pudesse apoiar não só o meu corpo febril, mas tudo que desabava...Em vão. Cai desfalecida. De um lado, a carta amassada e do outro uns versos de Whitman.

Ó vivendo sempre, sempre morrendo!
Os meus sepultamentos do passado e do presente,
Ó quando ando vigorosamente para adiante, material, visível,
[ imperioso como sempre;
Ó esse que fui por anos, agora morto (não me lamento, estou satisfeito),
Ó para desligar-me destes corpos meus, para os quais me volto,
[para olhar o lugar em que os joguei,
Passo adiante (Ó vivendo! Sempre vivendo) e deixo os corpos
[para trás.

Lembra-se como o conheci? Acho que nunca comentei. Na verdade pouco houveram de apresentações...Tínhamos outros afazeres e esperávamos pela mesma pessoa no momento. Era um bom homem e isto foi percebido imediatamente. Com o passar dos dias e nos caminhos que cruzávamos trocamos conversas simples, pelas circunstâncias.
Durante o nosso chá das quatro, naquele dia tempestuoso, o seu irmão, conhecido de ti querida Lúcia, chamou-me a estar em um local mais reservado. Não sei quais eram suas reais intenções em revelar-me sentimentos do nobre poeta que me fazia companhia em agradáveis caminhadas.

- Sabes, senhorita Aurélia, que estais por muitos desejada? - interrogou-me como se procurasse um interesse profundo de minha parte.
- Ah... Não sabia Hermano. E por quem? - respondi sorrindo, sem levar-lhe a sério, pois seu modo brincalhão tentava divertir as jovens senhoras sentadas, entre livros e um quente bule de chá.

Revelou-me sem pormenores. O primeiro não era de admirar, pois sua ousadia já era falada na corte ou nas casas de simples famílias. Entretanto, o segundo surpreendeu-me, e para não demonstrar minha inquietação continuei a sorrir...Com o decorrer dos dias seu interesse se tornou presente e após uma conversa franca revelei os meus sentimentos que por ventura não lhe agradariam. Ele declarou-se, e eu os neguei para não iludí-lo com promessas das quais eu não poderia cumprir.

- ... Então, me amas? - perguntei com os olhos úmidos escondidos na escuridão pela vergonha do que lhe causava.
- Não te preocupes! Eu nada espero de ti... - respondeu com uma voz rouca e falha.

Desaparecera por um tempo. Soube que havia viajado, repirar outros ares.

Passei por certos problemas de saúde e a sua presença, em retorno, confortou-me como se evaporasse minha culpa perante o seu sorriso e flores de melhora. Tão agraciada era a sua presença em minha família, como um filho e para mim um irmão.
Melhorei indiscutivelmente e voltamos as nossas caminhadas como antes, para mim o passado, os sentimentos estavam sendo esquecidos, levados por aquele vento fresco da primavera.

Fui sim, bela Lúcia, fui ingênua e mesquinha em permanecer junto, em tentar cultivar uma amizade que era impossível de manter-se erguida, por sentir-se bem em conversar tudo com ele, por amar a sua presença. Não percebi que para ele minhas palavras, meus sorrisos, meus gestos amistosos que eu compartilhava com todos que tinha apreço foram interpretados como sinais, nas entrelinhas como num verso de Bocage que cultua a natureza querendo permanecer no fogo...

Cavalgáva-mos como duas crianças pouco antes do anoitecer, conversávamos coisas supérfluas.
Meu confidente que transcrevia nossas tardes em sonetos.
Antes da chuva nos alcançar, ajudou-me a descer do cavalo branco, como um estrondo, apertou-me contra seu peito para amenizar o impacto de meus pequenos pés ao chão. Surpreendentemente nos aproximamos um pouco mais, o que jamais acontecera. Não sei ao certo se fora planejado, mas acredito que não pela índole de seu caráter. Aproximou-se como se quisesse beijar-me. Quase por instinto abaixei meu rosto, tão assustada e surpresa que uma só palavra não pronunciei. Corri para casa.

E me enchi de raiva e vontade de machucá-lo.Não sabes o quanto fiquei brava, por sua ousadia, mas o sentimento transformou-se em culpa. Culpa pela situação que eu causara. Eu sim, Lúcia. Eu devia ser machucada. Percebi o quanto era grave a minha amizade e o que ela causaria para ele, para mim e para meu noivo.

Chorei querida e me envergonho, pois eu, a mulher que desejei me tornar não choraria, não mais. Foi inevitável, pois posso ter sido boba e ingênua, Lúcia, mas dissimulada? Nunca. Repeli a sua presença dias após o acontecido, (não por ter tramado uma conquista e depois jogá-lo do seu pedestal,) se isso fora pensado. Mas, o repeli porque não mais sabia como agir, pois precisava afastar-me para o seu bem e o meu.

Eu não o amava como ele desejava, Lúcia, não como amo ao meu senhor, mas talvez ele encontrasse amor em minhas palavras ou em gestos... Eu não sei dizer. Percebi na sua tentativa de unir nossos corpos que o meu coração não era divisível. Caso fosse, eu teria me entregado. Porque isto não foi percebido por ele? Se me procuravas nas estrelinhas e para todos me tornei a dualidade em pessoa? Mas, isto já não me importa, que pensem.

Bem que me avisaste, em toda a sua plenitude, me avisaste doce Lúcia que a amizade não seria possível.

E eu?

Acreditava que sim.

Ainda desfalecida, em sonho, eu as vi. Eram três, sorriam e brindavam como mosqueteiras, parecia ter passado muitas décadas, pois eu não possuía a mesma face de outrora nem os olhos que brilhavam. Abaixo das espadas uma lápide.

- Aqui jaz um poeta!


Eu não sorria, Lúcia. Como eu poderia sorrir? Um belo rapaz sentado abaixo de uma Figueira me observava. Seguia-me com os olhos enquanto eu caminhava em encontro ao veículo. Até que pousou a vista em minha filha, sentada a fitá-lo no banco detrás. Era o seu filho, Lúcia. E como era parecido com o doce poeta que há tempos eu conhecera.

Despertei lentamente e a cor voltava a minha face. Amanhecera. O fim do ano se aproximava e tomaríamos rumos distintos à procura de uma sobra que amenize o calor do verão. Uma leve chuva caía...

Naquela manhã eu completara 21 anos e uma nova força me dava ânimo para levantar, afinal o casamento seria no inverno.

Abraços querida,

Aurélia.

segunda-feira, 19 de outubro de 2009

Amar!

Eu quero amar, amar perdidamente!
Amar só por amar: Aqui...além...
Mais Este e Aquele, o Outro e toda a gente
Amar!Amar!E não amar ninguém!

Recordar?Esquecer?Indiferente!...
Prender ou desprender?É mal?É bem?
Quem disser que se pode amar alguém
Durante a vida inteira é porque mente!

Há uma Primavera em cada vida:
É preciso cantá-la assim florida,
Pois se Deus nos deu voz, foi pra cantar!

E se um dia hei-de ser pó,cinza e nada
Que seja a minha noite uma alvorada,
Que me saiba perder... pra me encontrar...

(Florbela Espanca)

quarta-feira, 14 de outubro de 2009

Ouvir Estrelas



"Ora (direis) ouvir estrelas! Certo
Perdeste o senso!" E eu vos direi, no entanto,
Que, para ouvi-las, muita vez desperto
E abro as janelas, pálido de espanto...

E conversamos toda a noite, enquanto
A via láctea, como um pálio aberto,
Cintila. E, ao vir do sol, saudoso e em pranto,
Inda as procuro pelo céu deserto.

Direis agora: "Tresloucado amigo!
Que conversas com elas? Que sentido
Tem o que dizem, quando estão contigo?"

E eu vos direi: "Amai para entendê-las!
Pois só quem ama pode ter ouvido
Capaz de ouvir e de entender estrelas."

(Olavo Bilac)

sexta-feira, 9 de outubro de 2009

Antes de dormir

O silêncio por longos dias pairaram...
Nunca fiquei tão emudecida, inquieta e tive medo de que fosse percebido. Os seus olhos em verdade nada me diziam, ficaram silenciosos, mas gritavam palavras atropeladas que não pude compreender ao certo. Ou não quis compreender para que a minha dor não se tornasse mais presente. Afinal, poderiam arrancar metade de mim, mas eu não seria capaz de tocar um dedo se quer em seu corpo pálido, tinha receios de quebrar-lhe.

Fugi. Vergonha de fitar-me novamente. Pois, o que mais odiava era a idéia de não poder me distanciar, que o coração vacilasse e o peso das circunstâncias não fossem mais medidos. Depois de ler alguns capítulos de Balzac, levantei-me e parei, mecanicamente, alguns segundos na frente do espelho. Imaginei se Eugenia teria também aqueles traços exaustos. Espalhei os cabelos deixando-os caírem sobre os olhos, fiz uma careta, sorri, e nunca quis tanto sentir-me feia. Feia apenas o bastante para não ser percebida, como sempre desejei.

Talvez o dinheiro desta tenha sido realmente cobiçado por tantos admiradores. Mas, e eu? O que eu tinha? O que tenho que por mais que eu tente esconder, teima em ser, minuciosamente, declarado? Ainda estava parada ali, com os cabelos emaranhados e recordei-me do seu sorriso torto que eram frequentes, agora. Senti que a sua presença fazia-me bem, na verdade sempre soube. Como jamais havia sentido, como jamais quis sentir. Por que as mexas sempre teimavam em cobrir os meus olhos como se quisessem escondê-los?

Senti um leve calor em minha nuca, um elogio aos traços delicados refletidos no espelho e um convite. Por alguns minutos esqueci-me dos meus próprios pensamentos até o sono e o cansaço me tocar. Talvez em alguns momentos ao cruzar a sua porta, com a alegria de um pequeno sorriso em seus braços, ele não se esquecera dos seus também. Seriam os únicos momentos em que estaríamos felizes de verdade? Senti medo, por mim. Mas, estava feliz por ele. E talvez me suicidasse para que ele permanecesse assim.

Diário da paixão

Andei conversando com algumas pessoas essa semana e percebi o quanto todos estão preocupados e se questionam a respeito da paixão, sentimento complexo e indefinido que surge de repente e toma posse de nossos corações sem pedir licença. Começamos por olhar e admirar uma pessoa e, quando menos esperamos, nos tornamos alvos da “flecha do cupido”.
Quando nos apaixonamos e somos correspondidos, nos sentimos a pessoa mais especial do mundo, ficamos felizes em ter ao nosso lado o indivíduo que tanto gostamos e desejamos. Passamos a compartilhar com ele nossa vida e a querer estar cada vez mais próximos, mas, infelizmente, nem sempre acontece assim. Algumas vezes nos apaixonamos por alguém que consideramos perfeito aos nossos olhos, porém, não somos correspondidos, aí ficamos a sofrer pelos cantos, nos lamentando e buscando entender o porquê de tudo não acontecer como queríamos e o porquê de não ser notados. Contudo, pior do que se apaixonar pela pessoa que achamos ser a certa e não sermos correspondidos é se apaixonar pela pessoa errada e sermos correspondidos. Ficamos totalmente inertes diante da indecisão – pelo que optar: razão ou emoção?
A verdade é que, independente do tipo de pessoa por quem nos apaixonemos, se sofremos ou não com este sentimento, todos gostamos de sentir os sintomas da paixão. Gostamos tanto, que quando não estamos apaixonados tratamos logo de procurar alguém por quem fazer brotar loucamente este sentimento. Tudo engano! Ouvi alguém falar certa vez, que o mundo divulga a falsa idéia de precisarmos de um outro alguém para sermos felizes, alguém que amemos e que nos satisfaça, quando, na verdade, precisamos encontrar a felicidade individual que temos em nosso interior, devemos sermos felizes independente de um outro. Mas, quem não gosta de sentir o coração disparar, os olhos brilharem, o friozinho na barriga, o nervosismo e o emudecer diante da pessoa por quem nos interessamos?
Sei que não sou a pessoa mais experiente do mundo para falar de sentimento, alguns diriam que não tenho experiência nenhuma, outros, que sei até demais por ser jovem e ser alvo fácil desse tipo de coisa. Entretanto, independente do que digam, confesso que já fui vítima de todas essas formas de paixão. Estive e acredito ainda estar “sofrendo” da pior delas. Como tudo começou? Bem, não me lembro ao certo. Creio não ter sido da primeira vez que o vi, mas quando o olhar dele se voltou para mim impulsionado por um sentimento que até hoje me deixa intrigada e procurando respostas que possam defini-lo.
Apaixonada, inteiramente apaixonada por um alguém que, embora demonstre traços de simpatia não corresponde ao perfil idealizado. Ah, como eu queria me jogar em seus braços, sentir o calor do seu abraço, o sussurro de sua voz baixinho em meu ouvido, o sabor doce de seus beijos. Queria entregar-me loucamente, compartilhar e descobrir novas coisas, que sei que ele teria para me mostrar. Infelizmente o medo paralisa minhas ações, fico confusa diante da inconstância de suas atitudes e desejos. Contudo, não estou aqui tentando fazer nenhum tipo de cobrança, acredito ser esse um caso perdido, afinal, não podemos transformar as pessoas naquilo que desejamos. Estou apenas perplexa diante das proporções e dos “altos e baixos” deste sentimento. Parece que enquanto mais tentamos fugir mais somos dominados e entrelaçados pela paixão.A imagem dele se recusa a deixar meus pensamentos e mesmo tendo a certeza que não daria certo, fico sonhando. É só o que posso fazer no momento.
O bom da paixão (alguns podem discordar de mim neste momento), quando esta não atinge um estado mais elevado – o amor – é que da mesma forma inesperada como surgiu desaparece, deixando apenas lembranças, que podem ser boas ou ruins, isso irá depender do tipo de experiência de cada um. Eu, com certeza, ficarei com ótimas lembranças e espero ansiosamente o momento de seu abandono.

terça-feira, 29 de setembro de 2009

Alorna


Retratar a tristeza em vão procura
Quem na vida um só pesar não sente,
Porque sempre vestígios de contente
Hão de apar'cer por baixo da pintura;


Porém eu, infeliz, que a desventura
O mínimo prazer me não consente,
Em dizendo o que sinto, a mim somente
Parece que compete esta figura.


Sinto o bárbaro efeito das mudanças,
Dos pesares o mais cruel pesar,
Sinto que perdi tristes lembranças;


Condenam-me a chorar e a não chorar,
Sinto a perda total das esperanças,
E sinto-me morrer sem acabar.

(Marquesa de Alorna)

segunda-feira, 28 de setembro de 2009

Agora é tarde

O que procuras? Já não te disse que meu coração já não mais te pertence. Em meu peito bate agora um amor veloz, dilacerador, que arrebata os sentidos.
Palavras? Tuas palavras não fazem mais sentido. Acaso elas carregariam tuas atitudes não tomadas? Agora é tarde... não se pode voltar atrás do leite derramado, não há como resgatar-me, como te disse meu coração pertence a outro. Outro esse que me deu atenção, não me encheu apenas com palavras doces, mas executou cada uma das tais. Sinto muito, um dia te desejei demais, te quis demais, não via outro se não você. Agora é tarde!!!
Ah, como seria bom se voltasse a sentir por você todo ardor que um dia senti. Sentir minha pele arrepiar ao estar em teus braços, sorrir com tua chegada... queimar de amores por ti, te desejando desesperadamente. Agora não! Agora é tarde!

sexta-feira, 25 de setembro de 2009

Só hoje.



Só por hoje são seus, os meus onze segundos...

Pássaros Libertos


Palavras são pássaros.
Voaram!
Não nos pertencem mais.

(Helena Kolody)

Onde estivestes de noite

"Ah, e dizer que isto vai acabar, que por si mesmo não pode durar. Não, ela não está se referindo ao fogo, refere-se ao que sente. O que sente nunca dura, o que sente sempre acaba, e pode nunca mais voltar. Encarniça-se então sobre o momento, come-lhe o fogo, e o fogo doce arde, arde, flameja. Então, ela que sabe que tudo vai acabar, pega a mão livre do homem, e ao prendê-la nas suas, ela doce arde, arde, flameja."

(Clarice Lispector in "Onde estivestes de noite")

Ilusão

Estou aqui a observar-me.
O espelho não reflete mais minha imagem como antes.
Quem sou eu?
Procuro um rosto feliz, disfarço a dor,
finjo e escondo-me atrás de máscaras.
Solidão que me apavora!
Minha alegria se desmancha como o vento que passa e poucos percebem.
Sonhos? O que são? Onde estão?

Mundo de ilusão! Até quando!?

Paixão, desejo comedido, amores mal resolvidos.
Sentimentos indefinidos deixam-me inerte e muda.
Mundo, segurança e vida abalados e desestruturados.
Feliz com os pés no chão, impotente e fracassada com a loucura "sanada".
Preciso vomitar cada pensamento e atitude para me recompor.
Detestável criatura que sou!

Mundo de ilusão! Até quando!?

Retornar? Não posso mais.
Adiantar? Não valeria a pena.
Presente amaldiçoado!
Viverei...
Nobre colega, sábias palavras:
"Tempo efêmero. Passará? O que me resta? Desejar? Esperar?"
Disfarçar!

Mundo de ilusão! Até quando!?

quarta-feira, 23 de setembro de 2009

Incompleto Soneto


Apressam-se minhas palavras em te lembrar
Do breve encanto que teu olhar me encerra
O fervor dos teus beijos a me queimar
Restringindo a tortura desta espera

Senhora de tuas noites, apenas quero
Adormecer perdida no teu abraço
Aspirar todo encanto que com esmero
Oferes no aconchego do teu afago

Leva o frio inverno que em mim mora
Quando da tua ausência, solitária me vejo
Traz teu olhar que o meu sentido aflora

Entontece-me com a doçura de seu gracejo
Toma meus desejos em lençóis de cetim
Sou um incompleto soneto, rabisque em mim

"Está apaixonado"

"A alma é uma coleção de belos quadros adornecidos, os seus rostos envolvidos pela sombra. Sua beleza é triste e nostálgica porque, sendo moradores da alma, sonhos, eles não existem do lado de fora. Vez por outra, entretanto, defrontamo-nos com um rosto (ou será apenas uma voz, ou uma maneira de olhar, ou um jeito da mão...) que, sem razões, faz a bela cena acordar. E somos possuídos pela certeza de que este rosto que os olhos contemplam é o mesmo que, no quadro, está escondido pela sombra. O corpo estremece. Está apaixonado.
Acontece, entretanto, que não esxiste coisa alguma que seja do tamanho do nosso amor. A nossa fome de beleza é grande demais.(...)Cedo ou tarde descobrirá que o rosto não é aquele. E a bela cena retornará à sua condição de sonho impossível da alma. E só restará a ela alimentar-se da nostalgia que rosto algum poderá satisfazer..."

(Rubem Alves)

terça-feira, 22 de setembro de 2009

Carta

Queridas amigas,

Perdoe-me por ter faltado ao nosso chá das quatro, ontem. Não sabem o que se passou. Imagino a face de minha doce Carolina ao querer contar-me de sua casa recém construída.Ou o abraço de Mila, que me faz sentir-se acolhida a todo instante. Tenho visto a Lúcia com mais frequência, pelas ruas do Ouvidor, sempre absorta em seus pensamentos, mas com o olhar penetrante em seus objetivos como se um breve desvio lhe incubisse a derrota. Queria ter toda a coragem desta, a felicidade eterna de outra e o coração seguro de Emília.
Estava eu a passear pelos campos e o encontrei. Não sei lhes dizer o que senti. Talvez vergonha por não ter enfrentado a situação, os seus olhos estavam lá... Pela mulher que desejei ser não teria baixado a cabeça. Isto eu não me perdoarei. Mas, esperem, por favor, não me censurem. Aproveitei uma distração dos olhares em volta e o chamei, delicadamente, para estar comigo abaixo de um Ipê. Acompanhou-me meio receoso, porém, percebi um sorriso em seus lábios. E senti medo. O que ele espera de meu coração?E o que espero do seu?


segunda-feira, 21 de setembro de 2009

Retrato

"Eu não tinha este rosto de hoje,
assim calmo, assim triste, assim magro,
nem estes olhos tão vazios, nem o lábio amargo.
Eu não tinha estas mãos sem força,
tão paradas e frias e mortas;
eu não tinha este coração que nem se mostra.
Eu não dei por esta mudança,
tão simples, tão certa, tão fácil:
Em que espelho ficou perdida a minha face?"

(Cecília Meireles)

Onde foi que eu me perdi??

domingo, 20 de setembro de 2009

A vida é Sonho

É certo; então reprimamos; esta fera condição, esta fúria, esta ambição, pois pode ser que sonhemos; e o faremos, pois estamos em um mundo tão singular que o viver só é sonhar e a vida ao fim nos imponha que o homem que vive, sonha o que é, até despertar.

(A vida é sonho - Calderón de la Barca)

5 minutos

Calada da noite.

Toc, toc das pedras na janela.

Susto. Arrepio. Olhos de coruja a censurar.

Chiiii... Sussurros baixinhos. Medo de acordar.

Cordas jogadas ao relento, subindo devagar...

Despi-se a camisola.

Olha-se no espelho e se põe a pentear, olhos negros, segredos, medo do anseio, vertigens no ar...

Na alcova o silêncio, coração a despertar. Subindo devagar...

Toc, toc dos dedos para entrar, se apressar. Devaneio, tontura, calafrios, medo de acordar...

Toque suave, mãos nas mãos, olhos no olhar, lábios molhados, corpo em chama, desejo de amar...

Despindo o vazio, cheiro do mar. Suor, beijos, frio.

O inverno chegará.

Coxas quentes, pés ferventes, sentimentos contentes, faltam palavras para expressar.

Pureza presente, a-mar...ahhh...Toques sublimes, invasão ardente, medo de suspirar.

Amanhece.

Gaivotas apontam no barco ancorado. Desejo afogado. Hora de acordar.

Se o tempo parasse!...

Tarde de domingo. Ela caminha pelas ruas do bairro, cabelos levados ao vento e o sol de fim de tarde proporcionando uma sensação de prazer e bem estar. Não sabia ao certo como reagiria ao vê-lo, mas sua ansiedade apressava-lhe ainda mais os passos.
Ao chegar, ele a recebera tentando agir naturalmente, embora o nervosismo transparecesse em seu exterior. Estavam sós. O que fazer? Como proceder? Era a todo momento atraído e reprimido pelo olhar misterioso dela, ora mulher ora menina. E em meio ao cruzamento de olhares indefinido, o primeiro beijo.
Indescritível!... Os sentimentos oscilam. Amor, paixão, atração física apenas? O que os levaram a estarem ali? Valeria à pena correr o risco e enfrentar o mundo que espera ocioso oportunidades para condená-los? Isso era o que menos importava no momento. Que se raivem os moralistas!
Completamente envolvidos em olhares e beijos doces, audaciosos e frementes. Corações disparando, corpos em completa efervescência. E no dado instante... Pena! O tempo não pára.

sábado, 19 de setembro de 2009

Poeta insano

Insano!
Não enganarás a ti próprio? Não estarás tu demente?
Talvez buscas algumas horas felizes, horas que não me pertencem...
Pois, o tempo é efêmero. Estou bem e em um minuto posso não estar.
Estas foram as minhas palavras e não outras! Confundes um simples olhar?

Mente insana! Desejo ardente, consolação ao chorar...
Não é a tua hora de amar...

Sinto um nó na garganta, coração a papitar, todas as vezes que te vejo a clamar, por algo, que não posso te dar.
Perdoe-me cavalheiro, doce poeta, se atrasaste talvez, o arqueiro tomou o teu lugar.

Coração insano!Desejo ardente, consolação ao chorar
Não é a minha hora de amar...

Talvez em outro tempo ou em outro lugar. Não há nada o que eu possa fazer.
O tempo é efêmero. Passará! Esperar? Desejar?
Poeta insano! Arqueiro presente!
Sinto por ti. Tempo efêmero. Passará!
O que me resta? Desejar? Esperar?
Apenas, me afastar.

Diva

"Há meninas que se fazem mulheres como as rosas: passam de botão a flor: desabrocham. Outras saem das faixas como os colibris da gema: enquanto não emplumam são monstrinhos; depois tornam-se maravilhas ou primores...
Era Emília um colibri implume; por conseguinte um monstrinho."

(Diva, José de Alencar)

A viuvinha

"Depois, com as mãos entrelaçadas, iam ambos sentar-se a um canto do jardim, onde a sombra era mais espessa, e aí conversavam baixinho um tempo esquecidos; ouvia-se apenas o doce murmúrio das vozes, interrompidas por esses momentos de silêncio em que a alma emudece, por não achar no vocábulo humano outra linguagem que melhor a exprima.
A rulhar destes dois corações virgens durava até oito horas da noite, quando uma senhora de certa idade chegava a uma das janelas da casa, já tão iluminada, e, debruçando-se um pouco, dizia com a voz doce e afável:
- Olha o sereno, Carolina!"

(A viuvinha, José de Alencar)

Lucíola

"Lucíola é lampiro noturno que brilha de uma luz tão viva no seio da treva e à beira dos charcos. Não será imagem verdadeira da mulher que no abismo da perdição conserva a pureza d'alma?
Deixem que raivem os moralistas.
A sua história não tem pretensões a vestal. É musa cristã: vai trilhando o pó com os olhos no céu. Podem as urzes do caminho dilacerar-lhe a roupagem: veste-a a virtude."

(Lucíola, José de Alencar)

Senhora

"Há efetivamente um heroísmo de virtude na altivez dessa mulher, que resiste a todas as seduções, aos impulsos da própria paixão, como ao arrebatamente dos sentidos."

(Senhora, José de Alencar)

sexta-feira, 18 de setembro de 2009

Bem vindos...


"Quando ele convencer-me de seu amor e arrancar do meu coração a última raiz dessa dúvida atroz, que o dilacera; quando nele encontrar-te a ti, o meu ideal, o soberano do meu amor; quando tu e ele fores um, e que eu não vos possa distinguir nem no meu afeto, nem nas minhas recordações; nesse dia, eu lhe pertenço...Não, que já lhe pertenço agora e sempre, desde que o amei!... Nesse dia tomará posse de minha alma, e a fará sua!"

(Senhora, José de Alencar)