Havia em torno de nós e dentro de nós alguma
coisa da qual não me é possível entender, coisa pesada, uma sensação de
sufocamento e, sobretudo, aquela terrível solidão que alguns experimentam
quando estão rodeados de amigos e mesmo assim estão sós.
Os móveis da sala, a mesa posta, os copos em
que bebíamos, tudo em seu lugar exceto ele que há pouco saiu de cabeça baixa. Fatigado
pela minha presença, acredito. Eu não tive coragem. Assumi mais uma vez que
fracassei, que não fui cuidadosa com a gente? Que a vida por mais que eu tente
me impõe escolhas. Não sei o que aconteceu.
Alguém espia pela janela, olha pra mim, lá, só
nós dois, mas não me vê. Tomaram uma, duas, três... “A nós!”, ele disse. E eu
ali esperando, mas não me oferecem nenhum gole. Quando eu pus as mãos, ele
recolheu com violência, com raiva, eu acho, de quê? Estavam todos ali. Lambeu a
última gota em seus lábios.
Tocá-lo? Já não causa o mesmo efeito. Não sei o
que aconteceu. Adormeci sentada, num canto escuro, com um cheiro forte de suor.
Não era meu. Não passavam das 2 horas da madrugada. Busquei, em silêncio, uma
caixa vazia de lembranças, nada achei .
Na sala, algumas velas ainda acesas, meus
sentidos mais vivos, mas as faculdades do pensamento um pouco adormecidas. Perdi.
Perdi tudo aquilo. Perdemos tudo aquilo que chamamos de "nós". Eu fui
esquecendo, sabe... Foi tudo rápido demais, intenso demais, forte demais.
E, tremendo um instante entre as cortinas do
quarto, me mostrou afinal sobre a superfície da mesa. Mas a sombra era escura,
vaga, informe, não era sombra de ninguém que eu conhecia, mas eu fui me
lembrando, sabe... O cheiro de suor era tão grande, estava escuro, árvores
altas, um corpo sobre o meu, minhas roupas em pedaços e depois nada. Eu fui
esquecendo, sabe... primeiro os momentos, depois os sentimentos e, por fim, a
vida.
Eu
simplesmente esqueci que a morte consumiu, primeiro meus dedos, que costumavam
tocá-lo a face antes de dormir, depois meus olhos, que choravam todas as vezes
que ele não tinha certeza e, logo após a boca, já cheia de areia. Não tem luz,
nem ninguém me chama. Eu não sei mais por onde voltar, os caminhos marcados com doces, alguém
comeu. E depois, se foi.